A América Latina colecionou diversos golpes militares entre as décadas de 60 e 80. Neste episódio, vamos falar da ditadura no Chile, comandada por Pinochet entre 1973 e 1990, que começou de forma trágica com a morte do presidente Salvador Allende. Confira neste artigo como foi o golpe, o regime militar, as participações dos Estados Unidos e do Brasil, e o desfecho.
A história da ditadura no Chile tem, obviamente, muitos pontos em comum com todas as outras que ocorreram na América Latina no mesmo período. Os Estados Unidos buscavam desesperadamente evitar uma nova Cuba no continente, principalmente em um país economicamente mais relevante ou territorialmente maior.
Só que a questão chilena traz um ponto de diferença: se na Argentina e no Brasil os norte-americanos acusavam os presidentes de aproximação com o comunismo mesmo por medidas populares pequenas, no Chile o país era governado por um presidente socialista de fato.
Como foi a Ditadura no Uruguai
Salvador Allende
Salvador Allende chegou ao poder por voto popular, ou seja, não foi sequer necessário uma revolução ou algo do tipo. Assim que assumiu, Allende passou a implementar uma estrutura socialista. Ele, por exemplo, promoveu uma reforma agrária, distribuindo terras improdutivas dos grandes latifundiários — cerca de 35% dessas terras foram redistribuídas para o povo chileno.
Além disso, 30% da indústria manufatureira havia sido repassada para as mãos dos próprios trabalhadores, e os bancos estavam nacionalizados, concentrando 90% dos ativos financeiros.
Essa abordagem ficou conhecida como ‘via chilena para o socialismo’. Allende sabia que essas medidas criariam inimigos, principalmente dos Estados Unidos, que impuseram um bloqueio econômico ao Chile.
Oposição americana
Além dos norte-americanos, os grandes proprietários de terras e as elites econômicas chilenas começaram a fazer oposição cada vez mais forte ao presidente. Os Estados Unidos passaram a financiar essa oposição, e documentos mostraram que a CIA pagou 35 mil dólares a um grupo de militares chilenos para assassinar o General René Schneider, comandante-chefe do exército e fiel a Allende.
Após esse assassinato, muitos outros atentados foram planejados para derrubar Allende. Até que, em 11 de setembro de 1973, um grupo de militares chilenos começou um bombardeio sobre o palácio presidencial, que terminou com a morte de Allende, registrada como suicídio. Allende resistiu dentro do palácio com alguns colaboradores até a invasão dos militares.
Além da participação norte-americana, o Brasil também teve envolvimento no golpe. O país vivia na ditadura há 9 anos e teve origem de forma semelhante.
O governo brasileiro apoiou os conspiradores, isolou o Chile internacionalmente após o golpe e foi o primeiro a reconhecer a junta militar comandada por Augusto Pinochet, garantindo apoio político e diplomático. O Brasil também enviou agentes militares para atuar na repressão à oposição chilena.
Era Pinochet
Pinochet assumiu a presidência, dissolveu o congresso e proibiu todos os partidos políticos. A máquina repressora começou a perseguir opositores, e números de investigações chilenas apontam que 3.000 pessoas foram mortas pelo governo e mais de 40 mil foram torturadas, inclusive mulheres grávidas. Um dos principais locais de repressão foi o Estádio Nacional de Santiago, utilizado para detenção e tortura de aproximadamente 20 mil presos políticos.
Durante o governo de Pinochet, também ocorreu uma queima de 15 mil livros para apagar tudo que tivesse qualquer semelhança com o comunismo. A ignorância fez com que os militares queimassem até livros sobre o movimento artístico do cubismo, achando que tinha relação com Cuba.
Na economia, Pinochet causou mais estragos. Ele implementou medidas neoliberais, seguindo o grupo de economistas chilenos que haviam estudado em Chicago, conhecidos como os ‘Chicago Boys’. Entre as medidas, Pinochet reduziu gastos públicos, cortou programas sociais e privatizou instituições, incluindo universidades.
Ele também privatizou a aposentadoria dos chilenos, prometendo que receberiam o equivalente a 70% dos salários, mas a realidade hoje é que eles recebem apenas 37%. As únicas categorias que não foram afetadas foram militares e policiais, que seguiram recebendo 100% do último salário.
Fim da Ditadura no Chile
Em meio a pressões internas e externas, levando em conta que as ditaduras na Argentina, Brasil e Uruguai já haviam acabado, Pinochet teve que cumprir a constituição feita durante seu governo, que exigia um plebiscito para decidir se ele continuaria ou não. O povo votou ‘não’, e o Chile retomou a democracia. No entanto, foi criado para Pinochet o cargo de Senador vitalício, uma forma de se livrar das acusações de crimes da ditadura e enriquecimento ilícito.
Mesmo assim, Pinochet não conseguiu escapar totalmente. Em uma viagem para Londres em 1998, ele teve a prisão decretada pelo juiz espanhol Baltasar Garzón e foi detido pela Interpol. Ele ficou preso no Reino Unido por 503 dias, período em que fingiu estar doente, andando de cadeira de rodas e falando de forma desconexa. Conseguiu, assim, ser transferido de volta ao Chile, onde se levantou e andou normalmente como se nada tivesse acontecido.
A justiça chilena ainda condenaria mais de 50 agentes da ditadura, e esse número segue aumentando, pois o país continua com investigações e processos contra os militares que atuaram no regime.