A história da vacina é um capítulo importante. Recentemente, o mundo parou por causa do Coronavírus. Agora, se tudo isso ocorre por uma doença, imagine um mundo se todas as outras que vieram antes, como Sarampo, Meningite, Poliomielite, Febre Amarela e outras gripes, não tivessem vacinas. Fazer esta reflexão é fundamental, porque até hoje ainda existe um grupo grande de pessoas que é contra vacina.
Vacinação no Brasil: história e números
No Brasil, a história da vacina começa em 1804, trazida pelo Marquês de Barbacena. Somente 16 anos mais tarde o país teria o primeiro mapa anual de vacinação em massa. Só que foi no século XX que elas passaram a fazer parte da vida da maioria dos brasileiros.
Isso porque, em 1904, ocorre a obrigatoriedade da vacinação contra varíola, o que gera a Revolta da Vacina, pelo número de pessoas contrárias a esta decisão.
Revolta da Vacina
A Revolta da Vacina ocorreu de 10 a 16 de novembro de 1904, no Rio de Janeiro, que era a capital do país naquela época, graças à medida de Oswaldo Cruz para erradicar a Varíola.
A varíola é uma doença infectocontagiosa considerada uma das mais cruéis e catastróficas já existentes, matando mais de 300 milhões de pessoas pelo mundo — mais do que a Gripe Espanhola, a tuberculose e até mesmo as Duas Guerras Mundiais.
O vírus era transmitido pelas vias respiratórias, causando febre alta, dor de cabeça, dores nas costas e abatimento. Em seguida, surgiam erupções vermelhas pelo corpo, que causavam coceira e dor. Não existia tratamento, e a sobrevivência dependia da forma de varíola adquirida.
A mais grave tinha 30% de letalidade, enquanto a menor, 1%. No Brasil, Oswaldo Cruz foi escolhido pelo presidente Rodrigues Alves para chefiar a Diretoria de Saúde Pública, em março de 1903, com a missão de acabar com as doenças que dominavam a cidade e que afastavam investimentos estrangeiros, pois havia medo de vir ao Brasil.
Proposta de Oswaldo Cruz
O sanitarista então propôs que o governo criasse uma lei que obrigasse a vacinação em todo o país. Além de dar poderes às autoridades sanitárias para entrar nas casas, seriam criadas multas para quem se negasse e a exigência da vacinação para matrícula nas escolas, entre outras questões.
Isso gerou uma grande insatisfação, com a população acusando a proposta de ferir a liberdade individual. A manifestação também ocorria por má informação. Era um período sem rádio e com taxa de analfabetismo de 65%.
Além disso, do mesmo jeito que hoje existem teorias da conspiração sobre o surgimento de doenças, no passado parte da população temia que a vacina fosse uma estratégia para exterminar os mais pobres. Havia motivos: o governo de Rodrigues Alves queria modernizar o porto e remodelar a cidade.
A alegação oficial era sanitária, pois o crescimento desordenado fazia com que o Rio de Janeiro fosse conhecido como a “Cidade Pestilenta”.
Mas havia também o interesse em afastar a população pobre, principalmente os ex-escravizados que viviam na região. Com isso, ruas foram alargadas, barracos derrubados e avenidas construídas, como a Avenida Rio Branco.
Havia ainda setores militares e monarquistas que desejavam retomar o poder e inflamaram a população. O povo se rebelou e ocorreram quebras de bondes, depredações e ataques a agentes de saúde.
O governo reagiu com violência, decretou estado de sítio e suspendeu direitos constitucionais. A revolta foi controlada, mas deixou 30 mortos, 110 feridos, 1000 detidos e 460 deportados.
Mesmo assim, o governo revogou a obrigatoriedade, mas manteve a exigência do atestado de vacinação para trabalho, viagens, matrícula escolar e hospedagem em hotéis. O resultado foi positivo: o Rio de Janeiro erradicou a varíola. De 3.500 mortes em 1904, o número caiu para nove em dois anos.
A história da vacina no Brasil ao longo dos anos
A história da vacina evoluiu nos anos seguintes e muitas outras vacinas surgiram e apresentaram resultados expressivos. Na década de 1970, houve 11.545 casos de poliomielite, a paralisia infantil, e graças à vacinação ela desapareceu em 1989.
A coqueluche em 1991 tinha incidência de 10,6 por 100 mil habitantes e caiu para 0,32 em 1999. Os casos de difteria caíram de 495 para 56 no mesmo período. Já os de meningite, de 1.700 casos anuais em 1999, caíram para 23.
Na década de 1980, doenças como sarampo, poliomielite, rubéola, meningite e tétano causavam cerca de 5.500 óbitos por ano em crianças com até 5 anos. Hoje são apenas 50 mortes anuais.
Entre 1997 e 2015, a mortalidade infantil caiu de 31,9 para 13,8 por mil nascidos vivos, segundo o IBGE. Já a porcentagem de óbitos por doenças infecciosas caiu de 45,7% em 1930 para 4,3% em 2010, segundo o Ministério da Saúde.
Hoje, o Brasil é um dos países com maior cobertura vacinal do mundo, com mais de 300 milhões de doses aplicadas anualmente, com 26 vacinas disponíveis gratuitamente para doenças como Poliomielite, Tétano, Hepatite, HPV, Febre Amarela, Difteria, Influenza e Tuberculose.
Grupos antivacina
Ainda assim, há muitos grupos antivacina. Ao longo da história surgiram teorias religiosas e de extermínio populacional. Mas o grande impulso recente foi dado por um estudo publicado na revista The Lancet, em 1998, que associava a tríplice viral ao autismo.
Anos depois, descobriu-se que o autor do estudo recebia dinheiro de advogados que moviam ações contra fabricantes. Ou seja, havia interesse financeiro nas fake news desta história da vacina.
O artigo foi retirado e estudos comprovaram que não existe ligação entre vacinas e autismo, mas o estrago estava feito. Houve queda na vacinação e doenças antes erradicadas ressurgiram, como o sarampo, com 10 mil casos no Brasil em 2018.
Outra crítica é que a obrigatoriedade fere liberdades individuais. No entanto, é uma lei pública de saúde. Assim como ninguém pode simplesmente deixar de pagar impostos, não vacinar uma criança é também expor outras que ainda não podem ser imunizadas.
Em 2014, pesquisa do Ministério da Saúde mostrou que a média nacional de vacinação era de 81,4%, mas entre os mais ricos era de 76,3%. Ou seja, quem mais tem acesso à informação e recursos, é quem mais se recusa a vacinar.
E quem é contra não imagina o rigor do processo de aprovação: são cerca de 500 testes de controle de qualidade, em um processo que dura, em média, 10 anos. Os efeitos colaterais mais comuns são apenas febre, dor ou vômito leve.
O Zé Gotinha
Um capítulo importante na história da Vacina é o Zé Gotinha, Ele foi criado em 1986, pelo artista plástico Darlan Rosa, tornando-se símbolo da campanha de erradicação da poliomielite. Mais tarde, passou a ser usado para outras campanhas de vacinação infantil no Brasil.
Sugestões de livros sobre vacinação e saúde pública no Brasil:
- “A Revolta da Vacina e a Saúde Pública no Brasil” – Nicolau Sevcenko: https://amzn.to/4mvh67l
- “Revolta da Vacina” – André Diniz: https://amzn.to/3Fuy0SP