Nos últimos anos, surgiram grupos em defesa da volta da monarquia no Brasil, como o movimento ‘Príncipe de Verdade’ e o movimento pró-família imperial. Mas o que essa turma parece ter ignorado é que em 1993 o povo teve a chance de escolher e disse um grande ‘não’ para a monarquia no Brasil. Apesar dos argumentos usando a Bíblia, o plebiscito foi claro.
Constituição de 1988
O plebiscito surgiu durante a elaboração da Constituição de 1988. Na ocasião, o deputado federal Antônio Henrique Bittencourt da Cunha Bueno elaborou uma emenda para que o povo pudesse escolher se o país voltaria ao regime monárquico ou se permaneceria na república. Cunha Bueno defendia que a época de Dom Pedro II foi o período de maior estabilidade na história do Brasil. Um argumento que é repetido pelos defensores da monarquia até os dias de hoje.
No entanto, exaltar essa ‘estabilidade’ ignora que, durante o reinado de Dom Pedro II, o Brasil vivia sob o regime escravocrata. Apesar de ser possível elogiar alguns aspectos pontuais do governo, é absurdo tratar como positiva uma gestão que permitiu a escravidão durante 48 dos 49 anos de reinado.
Defensores alegam que eram ‘outros tempos’, mas, na metade do período de Dom Pedro II, somente Porto Rico e Cuba ainda permitiam a escravidão. E o Brasil foi o último país das Américas a abolir definitivamente a escravidão.
Durante a Assembleia Constituinte de 1988, a ideia de restabelecer a monarquia era ridicularizada por muitos. Cunha Bueno, porém, aproveitou um momento em que várias emendas estavam sendo negociadas para aprovar uma fusão com outras seis emendas. Permitindo que defensores de cada proposta se unissem para garantir a aprovação de todas. Lideranças políticas como Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso participaram dessas negociações.
Parlamentarismo x Presidencialismo
Uma das razões para a inclusão dessa emenda era que o plebiscito também decidiria entre o parlamentarismo e o presidencialismo. Uma discussão que muitos políticos desejavam retomar após ter sido rejeitada na votação da nova Constituição. A medida foi aprovada, e o plebiscito foi marcado para 7 de setembro de 1993. Mais tarde, uma emenda constitucional antecipou a data para 21 de abril de 1993.
Com a data marcada, começaram as campanhas na TV, rádio e jornais, o que tirou os herdeiros da família imperial de um anonimato quase total. Eles lançaram um slogan: ‘Vote no Rei’, tentando explorar a desilusão do povo após o impeachment de Collor. Afinal, o Brasil havia enfrentado uma longa ditadura militar, seguido pela morte do primeiro presidente civil eleito antes de assumir, e logo após viu o presidente eleito pós-ditadura ser removido do cargo em meio a um cenário de miséria e inflação galopante.
Resultados do Plebiscito
O movimento monarquista conseguiu 22% das intenções de votos nas pesquisas, com Luiz Gastão de Orleans e Bragança como principal representante. Embora houvesse uma divisão interna entre ele e Pedro Gastão, gerando um racha na família imperial que perdura até hoje. Em paralelo, a disputa sobre o sistema de governo opôs a frente presidencialista, que incluía lideranças como Leonel Brizola, contra o PSDB, que liderava a frente parlamentarista.
Curiosamente, anos depois, o PSDB buscou aprovar uma emenda constitucional permitindo a reeleição do presidente, contrariando sua própria defesa do parlamentarismo. No final, o plebiscito não trouxe grandes surpresas. Na disputa pelo sistema de governo, o presidencialismo venceu com uma ampla vantagem: 37,1 milhões de votos contra 16,4 milhões pelo parlamentarismo. Cerca de 13,4 milhões anularam ou votaram em branco, enquanto 23 milhões de eleitores não compareceram às urnas.
A decisão sobre a forma de governo foi ainda mais clara. Simplesmente 44,2 milhões de votos foram a favor da república, enquanto apenas 6,8 milhões apoiaram a monarquia. Mesmo somando os votos ausentes, a monarquia não teria chance de vencer. Foi um golpe terrível para a família Orleans e Bragança, que voltou ao anonimato por mais alguns anos, até ganhar alguma visibilidade mais recentemente com o apoio ao movimento bolsonarista.