A escolha do novo papa promete ser uma das mais importantes e disputadas da história recente da Igreja Católica.
Com a morte de Francisco, o conclave de 2025 será muito mais do que uma eleição religiosa: será também um embate entre visões de mundo — uma disputa entre quem deseja preservar o legado progressista de Francisco e quem busca reverter as mudanças iniciadas por ele.
Os Papas progressistas
Entre os principais herdeiros do projeto de Francisco está o cardeal italiano Matteo Zuppi, arcebispo de Bolonha e presidente da Conferência Episcopal Italiana.
Zuppi é visto como um defensor das causas sociais: atua na mediação de conflitos, na proteção de migrantes e na promoção de políticas inovadoras dentro da Igreja.
Seu nome é considerado o mais fiel ao espírito de Francisco, focado em uma Igreja voltada aos marginalizados.
Outro forte candidato para dar continuidade ao legado é Luis Antonio Tagle, das Filipinas.
Tagle simboliza a expansão global do catolicismo, especialmente na Ásia, e representa a opção de uma Igreja menos eurocêntrica e mais conectada com o “Sul Global”.
Com forte carisma e compromisso com a justiça social e o combate às mudanças climáticas, Tagle é visto como a cara de uma Igreja em transformação.
Mais um nome ligado à Francisco é Jean-Marc Aveline, arcebispo de Marselha. Tem uma natureza descontraída e uma grande proximidade ideológica com Francisco, especialmente em relação à imigração.
Nomes mais moderados
Mas a sucessão de Francisco não será um caminho tranquilo.
Dentro do próprio grupo progressista, há nomes mais moderados como Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano e braço direito de Francisco.
Parolin é considerado um diplomata hábil, mas com uma linha mais conservadora — o que pode agradar tanto reformistas quanto tradicionalistas, em busca de um consenso.
Teria ainda Peter Turkson, de Gana. Por mais que seja mais ligado ao conservadorismo, poderia também ser um Papa engajado a justiça social e a ecologia.
Bispos conservadores no Conclave
E do outro lado do tabuleiro, está o lobby conservador — que cresceu e se organizou ativamente nos últimos anos.
Figuras como Raymond Leo Burke, dos Estados Unidos, Gerhard Ludwig Müller, da Alemanha, e Péter Erdő, da Hungria, são os grandes representantes dessa ala.
Eles rejeitam as reformas propostas por Francisco: defendem o endurecimento das regras sobre a comunhão de divorciados e se opõem à bênção de casais homoafetivos.
Além disso, a extrema direita política mundial vê no próximo papa uma oportunidade estratégica.
Líderes como Donald Trump, Giorgia Meloni e Viktor Orbán, apoiados por organizações como o Napa Institute e o projeto Red Hat Report, têm interesse direto em garantir um papa que endosse pautas anti-imigrantes, anti-LGBT e antirreformas sociais.
Essa batalha nos bastidores envolve, inclusive, campanhas de desinformação para desacreditar cardeais progressistas e manipular a opinião pública — uma movimentação sem precedentes na história recente da Igreja.
Entre os conservadores em ascensão também estão Malcolm Ranjith, do Sri Lanka, conhecido por sua oposição às mudanças litúrgicas, e Fridolin Ambongo, da República Democrática do Congo, que, apesar de próximo de Francisco, é visto como um possível aliado dos setores mais tradicionais.
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O Colégio e a Igreja
A força do catolicismo na África e na Ásia, onde a Igreja cresce rapidamente, pode ser um fator decisivo.
Candidatos desses continentes não só representam uma mudança de eixo geográfico na Igreja, mas também trazem visões morais mais conservadoras, o que interessa à extrema direita.
Por outro lado, a composição atual do Colégio Cardinalício ainda favorece, em teoria, a visão de Francisco.
Dos 135 cardeais eleitores, mais da metade foi nomeada por ele, e muitos têm compromisso com causas como a justiça social, a proteção ambiental e a inclusão.
No entanto, a eleição de um papa não é matemática.
Pressões políticas, articulações de bastidores e o desejo de preservar a unidade da Igreja podem levar a escolhas inesperadas — muitas vezes, optando por figuras moderadas que consigam dialogar com diferentes correntes internas.
Seja qual for o resultado, uma coisa é certa: a escolha do próximo papa definirá não apenas o futuro da Igreja Católica, mas também seu papel no cenário político e social mundial.
Será que veremos a continuidade do projeto de uma Igreja aberta, próxima dos pobres e comprometida com as grandes questões do nosso tempo?
Ou será que o conservadorismo, impulsionado por uma nova aliança entre a religião e a política global, voltará a dominar o Vaticano?
A resposta virá das paredes silenciosas da Capela Sistina — e do fumo branco que, em breve, subirá novamente ao céu de Roma.