O Brasil tem um grande problema com sua história. Isso porque, de um lado, existe uma força muito grande para que não seja contada a parte da nossa constituição que envolve nossa origem africana e indígena, que é pouco visibilizada. Por outro lado, há um esforço imenso para transformar alguns personagens em heróis, como é o caso dos bandeirantes.
É importante entender que a história é mais construída do que relatada. Com o passar do tempo, surgem novos fatos e novas interpretações. O que era uma realidade no passado passa a ser visto de forma diferente à medida que a percepção muda. Isso é o que aconteceu com os bandeirantes, cujas ações ocorreram no século XVI, mas cuja história foi realmente contada apenas no século XVIII.
Criação da história
A história do Brasil foi basicamente produzida no Rio de Janeiro, onde ficavam a sede do Império e também o Instituto Histórico e Geográfico do Brasil. Nesse período, São Paulo começava a se destacar pela produção de café, ganhando destaque econômico no país, e surgiu a necessidade de criar sua própria história.
Foi aí que trouxeram à tona a história dos bandeirantes como grandes desbravadores e responsáveis pela expansão territorial do Brasil. Porém, até mesmo o nome ‘bandeirantes’ foi criado nessa fase do século XVIII. Isso porque, no século XVI, ninguém os conhecia como bandeirantes, mas sim como ‘paulistas’ ou ‘sertanistas’.
O que eram os Bandeirantes
Os grupos dos bandeirantes eram formados por um capitão, 12 homens brancos de origem portuguesa, 300 mamelucos (filhos de índios com portugueses) e milhares de escravos. Ao contrário da narrativa romântica, os bandeirantes escravizavam todos os indígenas que encontravam. Estima-se que mais de 400 mil indígenas foram escravizados e negociados pelos bandeirantes.
Esses grupos partiam de São Paulo, pois era a região com mais estradas indígenas para todos os cantos do Brasil e até outras regiões da América do Sul. Muitas das rodovias que temos hoje, como Dutra, Anchieta, Anhanguera, Fernão Dias, entre outras, eram antigas estradas indígenas construídas pelos nativos séculos antes.
A exploração
As expedições para o Norte, Centro-Oeste e outras regiões do Brasil eram basicamente para encontrar riquezas minerais, como ouro, prata e pedras preciosas. Os bandeirantes não criaram esses caminhos; eles seguiram trilhas feitas pelos indígenas e escravizaram as populações que encontravam.
Enquanto as populações das regiões eram dizimadas e escravizadas, os paulistas e bandeirantes enriqueceram com suas descobertas, sendo chamados de ‘piratas da terra’ ou ‘piratas do sertão’. Foram exatamente os descendentes desses bandeirantes, que ganharam fortunas explorando indígenas, que mais tarde se tornaram grandes cafeicultores e resolveram contar a história dos bandeirantes como grandes trabalhadores e responsáveis pelo progresso, ignorando o que fizeram com as populações e terras de outras regiões.